Pesquisadores da Trinity College Dublin recuperaram biomas de dois dentes que possuem mais de 4 mil anos e, por meio de análises genéticas dos microbiomas, foram observadas mudanças na área bucal, comprovando que, ao longo dos séculos, diversas mudanças ocorreram na carga dentária.

O Dr. Carlos Monson, presidente da Câmara Técnica de Odontologia Baseada em Evidências do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP), explicou que o estudo realizado pela universidade irlandesa demonstrou a presença, nas amostras obtidas, do Streptococcus mutans, uma bactéria presente na cavidade oral, dotada de elevada capacidade agressiva às estruturas dentárias devido à sua versatilidade em metabolizar carboidratos (tanto simples quanto os mais complexos).

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Esses compostos, que resultam tanto na formação de ácidos fortes (desmineralizando o esmalte e a dentina), quanto na transformação de açúcares solúveis na água em polímeros insolúveis (que passam a funcionar como matriz – infraestrutura – na organização do biofilme dental, onde outras espécies microbianas levam a uma disbiose oral), causam danos que vão muito além das estruturas dentais (perdas de esmalte, de dentina e perdas ósseas), provocando também acidentes vasculares, cerebrais e cardíacos, dermatoses inflamatórias crônicas (como a psoríase), quadros gastroentéricos e comprometimento da saúde da mulher.


“Se considerarmos que a busca que o artigo revela foi da ordem de 4.000 anos atrás, fica evidente que essas populações do norte da Europa refugiadas em cavernas encontravam-se segregadas do uso maciço de sacarose, podendo nos levar a supor que tais S. mutans, no máximo, só cresciam em fase multiplicativa. Isso possibilitava a oportunidade de que as polpas dentárias de dentes afetados por processos cariosos de evolução lenta desenvolvessem dentina secundária em direção às agressões sofridas como formas compensatórias, nos fazendo deduzir que “urgências dentárias” nessa época deveriam ser pouco frequentes”, afirma o cirurgião-dentista.

O Dr. Monson ilustra que, na década de 1970, o Brasil seguia o mesmo padrão mundial vigente na época, a exemplo do que aconteceu em regiões específicas na África Subsaariana e em regiões remotas da Oceania e do Sudeste asiático, antes da abertura da Rodovia Transamazônica, momento em que o contato inicial com as tribos indígenas que estavam isoladas na floresta por milênios era feito por meio de helicópteros que sobrevoavam as aldeias jogando doces, como forma de tornar a aproximação mais amigável. Posteriormente, foi possível ter uma noção do impacto que tal ação teve sobre a saúde dentária destas populações.

Na cavidade oral temos uma série de organismos, não só de bactérias, mas também de fungos, protozoários, parasitas e vírus, que mantêm entre si um equilíbrio dinâmico natural. Mudanças ambientais frequentemente podem provocar desequilíbrio ecológico do organismo e levar ao surgimento de novas doenças.

O especialista em Saúde Baseada em Evidências explica que as mudanças alimentares da população tiveram grande impacto nas alterações da saúde bucal: “Alimentos industrializados ricos em açúcar se constituem em um dos maiores problemas da globalização. O açúcar é um produto barato, que possibilita acesso à comida para milhões de pessoas, mas basicamente são calorias vazias, ou seja, não promovem nutrição e, ainda pior, facilitam o crescimento exponencial de cepas de S. mutans, aumentando o potencial de patogenicidade”.

Em termos evolutivos, 4.000 anos são considerados pouco tempo, e as mudanças na carga dentária foram diminuindo, uma vez que ocorreu a crescente ingestão de alimentos, por vezes mais amolecidos, que facilitam a mastigação. Uma das características é a redução do espaço de distribuição dentária nos maxilares, o que gerou redução no tamanho das presas e o domínio dos dentes do siso.

Futuro
Para um futuro com um bom desenvolvimento da carga dentária, o Dr. Monson afirma ser necessária a ingestão de alimentos naturais, saudáveis e o desenvolvimento de campanhas educativas visando o controle de biofilme para o equilíbrio das bactérias na boca.

Uma vacina anti-cárie ainda não foi desenvolvida, visto que esbarra com dificuldades na migração assertiva de anticorpos a partir da rede de vasos sanguíneos localizados em todas as áreas da orofaringe para neutralizar os microrganismos na matriz do biofilme dental. Assim, a melhor estratégia de controle de microbiota ainda é o uso de flúor presente na água.

Sobre o CROSP
O Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP) é uma autarquia federal dotada de personalidade jurídica e de direito público com a finalidade de fiscalizar e
supervisionar a ética profissional em todo o Estado de São Paulo, cabendo-lhe zelar pelo
perfeito desempenho ético da Odontologia e pelo prestígio e bom conceito da profissão e dos
que a exercem legalmente.

Hoje, o CROSP conta com mais de 175 mil profissionais inscritos. Além dos cirurgiões-dentistas, o CROSP detém competência também para fiscalizar o exercício profissional e a conduta ética dos Técnicos em Prótese Dentária, Técnicos em Saúde Bucal, Auxiliares em Saúde Bucal e Auxiliares em Prótese Dentária.
Mais informações: www.crosp.org.br

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