Por Tirso Meirelles, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp)
A falta de conexão entre o governo e o campo fica cada dia mais explícita com as decisões tomadas que impactam negativamente à agropecuária nacional. A decisão de zerar as alíquotas de importação de alimentos como carne bovina, arroz, feijão e derivados do leite, no intuito de combater a inflação, não levou em consideração a concorrência desleal com produtos importados subsidiados e quadro global de oferta e demanda. Ao contrário, essa medida evidencia a falta de conhecimento do setor agropecuário, pois não identifica corretamente a origem do problema e negligência os desafios enfrentados no campo para que o Brasil continue a ser um dos principais players mundiais na produção de alimentos.
A estratégia parte do princípio de que a concorrência com produtos importados pode aliviar a pressão inflacionária e beneficiar a população, especialmente as camadas mais vulneráveis, que são afetadas pelo aumento do custo de vida. A proposta visa mostrar e valorizar a ação do Governo, com forte apelo de marketing, mas gerará frustração aos consumidores e àqueles que acordam antes do sol nascer para garantir o sustento de suas famílias e a segurança alimentar da população.
Com a entrada de produtos estrangeiros a preços mais baixos, eventualmente com subsídios, os produtores brasileiros serão desestimulados e certamente irão enfrentar dificuldades para competir, uma vez que lidam com custos elevados de produção, incluindo insumos dolarizados, energia e tributos. Isso pode levar a uma redução ainda maior nas margens da agricultura, em um momento já delicado, em que os produtores acumulam prejuízos e a inadimplência cresce, enfraquecendo a economia local e o emprego no campo. Sofremos não apenas com atitudes como essa, mas com a falta de estruturas de armazenamento, o que eleva as perdas e custo logístico.
Esse, entretanto, não é um problema novo. No ano passado já tivemos a importação desenfreada de leite em pó de países do Mercosul, fazendo com que o setor leiteiro ficasse ainda mais pressionado, uma vez que os insumos são caros e o valor de venda baixo. Na época da tragédia no Rio Grande do Sul, por exemplo, ao invés de fazer girar a safra de arroz já colhida na região, como forma de ajudar os agricultores gaúchos, o governo federal optou por importar arroz de outros países para, supostamente, evitar o desabastecimento.
É triste perceber que falta conhecimento do Poder Executivo sobre um dos pilares de sua economia: o setor agropecuário. Produzir no Brasil é questão de fé, de esperança e resiliência. Sofremos sem uma política agrícola que realmente incentive e sustente a longo prazo a produção nacional. E vale lembrar que temos o desafio de produzir mais, preservando o meio ambiente. Hoje o Brasil preserva cerca de 66% de sua mata original, sendo que parte considerável desse total encontra-se nas propriedades rurais. Temos um código florestal extremamente rígido, que garante um nível de preservação dentro das propriedades e um equilíbrio entre produção e conservação sem paralelo em outros países.
A eliminação de tarifas de importação de alimentos é apenas um elemento dos muitos que convivemos no dia a dia e que pode nos fazer regredir mais de 50 anos. Para aqueles que não conhecem a história do nosso país, há mais de meio século vivíamos então sem oportunidades no campo, com a população rural buscando alguma forma de sustento nas cidades e o governo importando tudo. Essa é uma página que não queremos reviver! Chegamos a um patamar cujo Norte é o infinito, mas é preciso que o governo conheça e respeite o setor agropecuário para que possamos mostrar a força e vocação do Brasil na garantia da segurança alimentar.
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