Muitas são as curiosidades a cerca do comportamento do cães que, muitas vezes, parece ser similar ao de humanos. Seguindo por esse caminho, duas novas pesquisas trouxeram dados interessantes, que apontam para a possibildiade desses pets também desenvolverem vício e compulsão.
O primeiro estudo mostrou que alguns cães podem se tornar compulsivos com seus brinquedos, assim como seres humanos, por exemplo, podem se viciar em jogos de azar ou eletrônicos.
Já o segundo trabalho demonstrou que alguns cachorros, considerados “superdotados”, são capazes de classificar objetos por função naturalmente, algo até então observado só em poucos animais submetidos a treinamentos intensivos, nunca de forma espontânea.
Embora os cães tenham comportamentos complexos e, muitas vezes, possam reproduzir emoções e hábitos de seus tutores, essa é a primeira vez que se prova cientificamente que podem desenvolver vícios e compulsões.
Novas descobertas
O estudo sobre vício canino foi publicado na edição desta semana da revista Scientific Reports. Seus autores sugerem que esses animais são o primeiro exemplo não humano de uma espécie que desenvolve espontaneamente comportamentos semelhantes a vício.
A descoberta pode levar a uma melhor compreensão também sobre os vícios humanos, afirmou Alja Mazzini, da Universidade de Berna, na Suíça, principal autora do estudo.
O motivo é que o trabalho pavimenta o caminho para investigações sobre impulsividade, atenção e recompensa em cães. Esses mesmos aspectos são importantes para o estudo de transtornos humanos, como TDAH e compulsões.
Mazzini e seus colegas constataram que alguns cães parecem não conseguir viver sem seus brinquedos favoritos, como bolinhas, e essa obsessão supera o simples entusiasmo e se assemelha a um vício.
Os vícios em seres humanos se caracterizam pelo envolvimento compulsivo em determinadas atividades, mesmo com consequências negativas.
Embora já houvesse relatos de que alguns cães exibem comportamentos semelhantes a vícios em relação a brinquedos — por exemplo, choramingar quando o brinquedo está fora de alcance e continuar brincando apesar do cansaço excessivo ou de lesões —, a nova pesquisa é a primeira avaliação científica publicada sobre o tema.

Processo de análise
Os cientistas compararam sintomas de vício humanos, como sentir desejo intenso e dificuldade em interromper ou controlar um comportamento, com os de 105 cachorros. Estes foram selecionados por serem, segundo seus tutores, “muito motivados a brincar com determinado brinquedo”.
Foram analisados os comportamentos de 56 cães machos e 49 fêmeas em relação a um brinquedo escolhido pelos próprios cães no início do teste. Os cães tinham entre 12 meses e 10 anos de idade.
As raças mais frequentes foram pastor malinois (18 cães), border collie (nove) e labrador (nove).
A compulsão parece ser mais usual em raças de trabalho, conhecidas por seu alto impulso para brincar e caçar. Segundo os cientistas, em alguns casos, a motivação exagerada pode ter sido reforçada pela seleção genética voltada ao desempenho.
Os autores também consideraram o comportamento cotidiano de seus cães em relação aos brinquedos.
Os cientistas viram que 33 cães apresentaram comportamentos semelhantes a vícios. Esses comportamentos incluíam fixação excessiva em um determinado brinquedo; falta de interesse em alternativas como comida ou brincadeiras com o dono; tentativas persistentes de alcançar o brinquedo quando ele estava indisponível e incapacidade de se acalmar por até 15 minutos após todos os brinquedos serem retirados.
Quando o brinquedo estava fora de alcance, eles tendiam a passar mais tempo focados nele e tentando acessá-lo, priorizando essa tentativa em vez de comer ou interagir com o dono.
Os animais foram submetidos a uma série de testes. Eles podiam escolher entre brinquedos, comida e interação social. Em várias situações, os cães mais “viciados” ignoravam todas as alternativas e permaneciam tentando recuperar o brinquedo. Mesmo quando estavam cansados, sozinhos ou quando o objeto era retirado, continuavam excitados e inquietos.
— Alguns cães demonstraram um grau de envolvimento que poderíamos chamar de compulsivo e semelhante a vícios comportamentais humanos — afirmou Stefanie Riemer, da Faculdade de Medicina Veterinária de Viena, na Áustria, e uma das autoras do estudo.
Resultados
Segundo o estudo, as reações dos cães lembram os mecanismos ligados a vícios em humanos. Em ambos os casos, o comportamento começa proporcionando prazer, mas evolui para compulsão sem caráter prazeroso.
Nos humanos, o vício games ou apostas, por exemplo, ativa os mesmos sistemas cerebrais de recompensa ligados ao neurotransmissor dopamina e aos opioides. Logo, os autores acreditam que entender esses paralelos entre espécies pode ajudar a desvendar os fundamentos biológicos dos vícios comportamentais.
“Assim como algumas pessoas jogam até prejudicar a própria vida, certos cães parecem incapazes de parar de brincar. Porém, nem todo entusiasmo é um vício. Ainda não temos critérios clínicos para definir quando o prazer se torna patológico”, disseram os cientistas no estudo.
Os cientistas planejam estudar se os cães “hipermotivados” apresentam diferenças neurológicas ou genéticas, e se há paralelos com distúrbios observados em humanos.
Enquanto isso, os autores recomendam cautela. Brincar é saudável e essencial para o bem-estar canino, mas quando o cachorro ignora comida, donos ou descanso em favor do brinquedo, talvez seja hora de dar uma pausa no jogo.
Fonte: O Globo, adaptado pela equipe Cães e Gatos.
FAQ sobre o vício e a compulsão em cães
Como foi realizado o estudo que analisa esses comportamentos em cães?
Um dos estudos analisou o comportamento de 56 cães machos e 49 fêmeas em relação a um brinquedo escolhido pelos próprios cães no início do teste. Os animais tinham entre 12 meses e 10 anos de idade e as raças mais frequentes foram pastor malinois (18 cães), border collie (nove) e labrador (nove).
Em quais animais a compulsão é mais comum?
A pesquisa aponta que a compulsão parece ser mais usual em raças de trabalho, conhecidas por seu alto impulso para brincar e caçar.
Quando deve-se tomar cuidado com a compulsão nos cães?
Se um animal deixar de comer ou ignora os donos e o descanso a favor do brinquedo, é preciso cautela.
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