Meyer com a bola toda em passagem pelo Juventus catarinense
Por Rodrigo Viudes
É debaixo do sol escaldante do Mato Grosso do Sul, no centro-oeste do Brasil, que um filho de suíço já iniciou a pré-temporada para a disputa da elite do estadual de futebol, de volta ao Dourados Atlético Clube (DAC). A descendência europeia, no entanto, fica apenas na certidão de nascimento do catarinense Luiz Antonio Meyer, um especialista há décadas em preparar goleiros para impedir a alegria do futebol: o gol.
Entre tantos profissionais lapidados, nomes que atuaram no Marília Atlético Clube (MAC) como Marcelo Cruz, campeão da A2 e vice do Brasileiro da Série, ambos em 2002 pelo Tigre, e Mauro, campeão do Brasileirão 2004, pelo Santos.
Em entrevista ao Fala Marília, o preparador de goleiros conta como superou o luto na juventude pelo futebol; a breve carreira de goleiro, com ‘direito’ a gol do Fantástico e seus clubes de coração. “Sou Chape e maqueano”, frisou.
ÓRFÃO
Meyer é catarinense de Abelardo Luz, terra-natal do craque Paulo Roberto Falcão. É filho do relacionamento entre a enfermeira gaúcha Elza Danicolo e o médico suíço, Cristiano Meyer, diretor do hospital onde nasceu em 16 de março de 1964.
“Fui criado por uma família suíça. Quando nasci, minha mãe me deu”, conta Meyer. Apenas três meses depois, ele já estava morando na vizinha Xanxerê (SC), onde passaria toda infância e juventude. “Fiquei lá até morrer meus pais”.
Meyer perdeu o pai aos 7 anos, em 1971. Onze anos depois, a mãe, de câncer. Aos 18, embora adulto, estava órfão. “O futebol foi uma boa saída para mim. Não me criei em drogas, não fumo. Bebo só de vez em quando”, diz.
GOL DO FANTÁSTICO
Aos 17, Meyer já havia iniciado a carreira como goleiro, no Joinville (SC). Poucos meses depois, mudou-se para a Chapecoense, em Chapecó (SC), para ficar mais próximo de casa da família e cuidar da mãe, em Xanxerê (SC).
Depois da estreia como profissional – um empate sem gols contra o Inter de Lajes (SC) – deixou a Chape. Mas, precisou voltar às pressas, buscado em casa por dois diretores. Com titular e reserva sem condições de jogo, sobrou para ele a titularidade.
O jogo contra o Figueirense terminou empatado em 1 a 1. “Mas eu tomei um gol do meio da rua. Um tal de Hélio de uma paulada na gaveta. Foi o gol do Fantástico. O Léo Batista ainda disse: ‘bateu sem chance para Luiz Antonio’”, recordou Meyer.
HOMENAGEM PÓSTUMA
O jovem goleiro ficaria mais um ano na Chape e iria para o Inter de Lajes, onde conquistaria seu primeiro título como jogador no Catarinense, ainda pelo sub-20. A faixa foi depositada no túmulo da mãe. Meyer ainda venceria a divisão de acesso pela Caçadorense, em 1989, passaria por outros clubes, mas penduraria precocemente as luvas, aos 25 anos. “Tive uma bursite no ombro esquerdo”, justificou.
Em sua última exibição debaixo das traves, em 1990, Meyer foi o destaque da goleada de 4 a 1 contra o Criciúma, em Caçador (SC). Apesar da derrota, o time então dirigido por Levir Culpi conquistou a Taça Governador do Estado.
HINO DA CHAPE
Meyer recebe placa concedida pelo então presidente Nei Maidana em agradecimento pela composição do hino da Chape
Embora tivesse encerrado a carreira de goleiro, Meyer voltou à rotina de treinos, de luvas calçadas, ainda Caçadorense, mas como preparador. Em 1995, ele voltaria à Chapecoense, onde perpetuaria seu nome além dos gramados. Além de preparar os goleiros do verdão do oeste catarinense para o estadual, Meyer se dispôs a escrever o novo hino do clube. “Demorei duas horas e quarenta minutos para montar (sic) a letra”, contou.
Meyer é o primeiro agachado de verde à esquerda na foto oficial da Chape campeã de 1996
A nova música oficial do clube seria executada na conquista do estadual da elite de 1996. Vinte anos depois, a tragédia do voo da Chape revisitaria aspectos históricos do clube e Meyer seria lembrado também como compositor. “Perdi uns dez amigos. É algo que marcou muito”, lamentou.
MAQUEANO
Naquele ano de 2016, Meyer estava em sua terceira e breve passagem pelo Marília, clube em que acumulou mais acessos de todos que trabalhou: quatro de 17 já conquistados. Em 1999, subiu da extinta ‘B1’ (4ª Divisão) para Série A3; em 2001, da A3 para A2; em 2002, da A2 para elite e da Série C para B do Brasileiro. Ao todo, Meyer já faturou nove títulos na carreira.
Meyer e dois dos grandes goleiros com quem trabalhou no Marília, Mauro e Pedro Paulo
“Não é fácil passar pelo futebol de São Paulo e ainda conquistar um acesso. Imagine quatro”, afirmou Meyer. “Além da Chape, o Marília é o time do meu coração. Ter morado em Marília foi excelente. E olha que já passei por muitos lugares”.
Das demais conquistas, o preparador destaca as alcançadas em seu próprio estado. “Tenho acessos e títulos nas duas divisões inferiores e na elite catarinense”, citou. Ele ainda levantou troféus no Matogrosso do Sul e no Rio Grande do Sul.
TAILÂNDIA
Além dos estaduais brasileiros, Meyer também faturou uma competição nacional, mas a 17 mil quilômetros do Brasil. Em 2007, sagrou-se campeão da Copa Yamaha pelo Tobacco Monopoly Thailandia, no sudeste asiático. Meyer ficou por lá por apenas uma temporada. Suficiente, no entanto, para aprender tailandês a ponto de cantar em karaokês nas horas vagas. Um pastor brasileiro que morava por lá lhe ajudou como intérprete. O novo amigo morreria de Covid na pandemia.
Meyer é o de branco na foto de comemoração de título por clube da Tailândia
No campo, Meyer levou o goleiro à seleção nacional da Tailândia, que conquistaria a Copa da Ásia. “Foi uma experiência pessoal e profissional muito interessante ter trabalho lá. Não tenho intenção de sair do país de novo, mas quem sabe volte pra lá”.
FAMÍLIA
Residente há nove anos em Dourados (MS), Meyer é casado com Iara e pai de Andressa e Janaína, filhas de outro relacionamento. A rotina caseira estimula o preparador de goleiros a perseguir sua próxima meta.
Meyer e a taça de campeão da Série B do Sul-matogrossense pelo DAC
“Quero ser campeão pelo DAC na elite. Já fomos vice, em 2021, no segundo ano de fundação do clube, e agora vamos trabalhar para garantir o título”, afirmou. A estreia é contra o Corumbaense, dia 21 de janeiro de 2024, em casa.
Aos 59 anos, Meyer nem cogita qualquer possibilidade de aposentadoria. “Mas, vai chegar uma hora que a potência vai diminuir”, ponderou. Até lá, o preparador terá que lidar com o corpo e o tempo. Nada que não possa ser cronometrado por um filho de suíço.
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