Por que esperamos que pais se formem em cinco dias?​​​​​​​​​​​​​​​​

Por Marcos Piangers

No quinto dia, quando o sol começava a se recolher, entendi aquele absurdo matemático: acabava o tempo que tive pra conhecer o grande amor da minha vida. Voltei pro trabalho na segunda-feira, olheiras profundas e um vazio no peito, enquanto minha esposa, ainda se recuperando do parto, enfrentava sozinha as tardes infinitas e os choros indecifráveis da nossa recém-chegada Anita.

A licença paternidade de cinco dias no Brasil é como um convite para jantar onde você só pode ficar para o aperitivo. O Estado me diz: “Seja bem-vindo à paternidade! Agora volte ao trabalho.” Como se criar vínculos, aprender a trocar fraldas, acalmar choros noturnos e apoiar a mãe exausta fossem habilidades instantâneas, comprimidas em 120 horas cronometradas. Trinta dias seriam o mínimo decente para que um homem pudesse mergulhar nesta transformação sem o relógio marcando constantemente o retorno à “vida normal”.

Ainda me dói lembrar como a Ana me olhou naquela manhã do sexto dia, quando ajeitei a roupa e saí pela porta. Seus olhos carregavam uma mistura de coragem e desamparo. Hoje, vinte anos depois da minha primogênita, ainda carrego aquela culpa. Somos um país que fala de família mas não permite que pais sejam pais integralmente. E assim vamos construindo gerações de homens divididos entre o que deveriam ser e o que lhes permitem ser.

Nuvens carregam água por dias até chover. Sementes aguardam estações inteiras para brotar. A lua leva um mês para completar seu ciclo. Por que esperamos que pais se formem em cinco dias?​​​​​​​​​​​​​​​​

Trinta dias é o mínimo. Licença-paternidade já.

Deixe um Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *