O partido do presidente da Argentina, Javier Milei, venceu as eleições legislativas do país no domingo 26, após uma campanha marcada por escândalos.
Com mais de 95% dos votos apurados, A Liberdade Avança obteve 40,84% dos votos em todo o país, no pleito que foi visto como um referendo sobre os quase dois anos de mandato do autoproclamado anarcocapitalista. A oposição peronista, Força Pátria, obteve 31,67% de apoio.
Embora o resultado não garanta maioria no Congresso para Milei — ela permanece com os peronistas —, a vitória, considerada surpreendente pela imprensa da Argentina, indica um cenário mais positivo para o presidente, com a cautela do público ante a um possível retorno à crise econômica de governos anteriores, avaliaram especialistas argentinos ouvidos pela agência de notícias Reuters.
A popularidade do presidente caiu nos últimos meses devido a cortes nos gastos públicos, o aumento do dólar e também a um escândalo de corrupção ligado à sua irmã, Karina. O governo havia minimizado as expectativas em relação ao pleito, considerando qualquer resultado entre 30% e 35% dos votos satisfatório — especialmente após o revés de Milei nas eleições provinciais de Buenos Aires em setembro, quando perdeu para os peronistas por catorze pontos percentuais.
Desta vez, o partido de Milei virou o jogo, vencendo no maior distrito eleitoral da Argentina, que abriga cerca de 40% do eleitorado.
“Eu sou o rei de um mundo perdido”, cantou Milei ao subir ao palco diante de centenas de apoiadores em um hotel em Buenos Aires. “Hoje ultrapassamos o ponto de inflexão – começa a construção de uma grande Argentina.”
Pouco antes das eleições, ele havia viajado aos Estados Unidos, onde conseguiu do presidente Donald Trump um resgate no valor de US$ 40 bilhões para a economia argentina — que o líder americano havia condicionado ao seu bom desempenho nas urnas. Milei acenou ao aliado durante o discurso de vitória na noite passada, descrevendo o empréstimo como “algo sem precedentes, não apenas na história argentina, mas na história mundial, porque os Estados Unidos nunca ofereceram apoio de tal magnitude”.
“Agora estamos focados em implementar as reformas que a Argentina precisa para consolidar o crescimento e a decolagem definitiva do país – para tornar a Argentina grande novamente”, disse o presidente em espanhol, ecoando o slogan trumpista.
Trump logo ofereceu seus parabéns, caracterizando o desempenho do partido de Milei como uma “vitória esmagadora”. Durante visita à Ásia nesta segunda-feira, 27, o americano disse que o argentino teve “muita ajuda” de Washington.
“Ele teve muita ajuda nossa. Ele teve muita ajuda. Eu lhe dei um apoio, um apoio muito forte”, disse Trump. “Estamos mantendo muitos países da América do Sul. Estamos com foco grande na América do Sul”, completou.
Em disputa na eleição estavam 127 das 257 cadeiras na Câmara dos Deputados e um terço do Senado, além de 24 das 72 cadeiras. O partido de Milei garantiu 64 cadeiras na Câmara dos Deputados e 12 no Senado. Até então, o presidente tinha apenas 37 dos 257 deputados e seis dos 72 senadores.
Já o Força Pátria, principal bloco da oposição, levou 31 cadeiras na Câmara e 6 no Senado. Somando os aliados, a força de oposição peronista ganhou 44 vagas na Câmara e 7 no Senado.
Assim, o governo alcançou seu principal objetivo para esta eleição: garantir pelo menos um terço da Câmara para sustentar os vetos presidenciais.
Governo à base da motosserra
Milei chegou à Presidência há quase dois anos com um plano para passar a “motosserra” em gastos públicos, eliminando dezenas de milhares de empregos no governo e congelando investimentos em infraestrutura, saúde, educação e até mesmo o fornecimento de medicamentos para aposentados.
Ele conseguiu reduzir a inflação de mais de 200% em 2023 para cerca de 30% em setembro, alcançando o primeiro superávit fiscal do país em 14 anos. A atividade econômica cresceu 0,3% em agosto de 2025, após três meses consecutivos de queda.
Mas o poder de compra despencou: a maioria dos argentinos afirma estar com dificuldades para sobreviver, mais de 250 mil empregos foram perdidos e cerca de 18 mil empresas fecharam.
A popularidade do libertário também foi afetada quando Milei promoveu uma criptomoeda que posteriormente faliu; sua irmã e membro mais poderoso do gabinete, Karina Milei, foi implicada em um suposto esquema de corrupção; e um dos principais candidatos de seu partido desistiu da eleição de domingo após admitir ter recebido US$ 200 mil de um empresário acusado de tráfico de drogas nos Estados Unidos.
Para evitar a desvalorização do peso, o governo queimou suas reservas em dólares, mesmo após tomar um empréstimo de US$ 20 bilhões (dos quais US$ 14 bilhões já foram desembolsados) do Fundo Monetário Internacional (FMI). Por isso, foi forçado a recorrer a Trump, que veio em seu socorro com um resgate de US$ 40 bilhões.
A postura de Trump foi vista por muitos no país como uma interferência na eleição, e alguns previram que – devido ao sentimento antiamericano entre partes da população – seu apoio poderia ter um efeito contrário ao que Milei esperava. O cenário, porém, não se concretizou.
Além disso, embora o voto seja obrigatório, a participação eleitoral foi a menor desde o retorno à democracia em 1983, com 67,85% de participação. O recorde anterior, registrado em 2021, era de 71%.













