Como Lula virou o jogo depois da crise do Pix

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva passou por uma virada de chave digital a partir de julho deste ano. Após enfrentar fortes desgastes nas redes sociais — especialmente após as polêmicas do Pix e do IOF, que mobilizaram a oposição e forçaram recuos do Planalto —, o governo reestruturou sua comunicação e incorporou a lógica e a linguagem do ambiente digital.

A avaliação é de Marcelo Tokarski, CEO da Nexus, empresa especializada em pesquisa e inteligência de dados, em entrevista ao programa Os Três Poderes, de VEJA, apresentado por Marcela Rahal.

“O governo mudou a estratégia. Antes, ele decidia, comunicava e só depois adaptava a mensagem para as redes. Agora, a narrativa digital veio para o centro da comunicação”, afirmou Tokarski.

Segundo o especialista, o estudo da Nexus mostra que, desde julho, o presidente Lula passou a ter desempenho estável e positivo nas plataformas, revertendo parte da vantagem que a direita mantinha no campo digital desde as eleições de 2022.

Da derrota digital à reorganização

Em julho, o ambiente era de crise. O governo havia sofrido uma “derrota digital”, nas palavras de Tokarski, quando o deputado Nicolas Ferreira (PL-MG) viralizou com um vídeo sobre o Pix, obrigando o Executivo a recuar na proposta de taxação.

“Aquele episódio foi um marco. Mostrou que o governo ainda não entendia a dinâmica das redes”, avaliou o CEO da Nexus. “De lá para cá, a comunicação mudou: o governo passou a planejar políticas já com foco em como elas seriam recebidas digitalmente.”

Continua após a publicidade

A mudança coincidiu com o lançamento de programas de apelo popular, como o Gás para Todos, e com uma intensificação no investimento em engajamento online. Segundo Tokarski, o Planalto começou a atuar de forma profissionalizada, com produção constante de conteúdo, linguagem adaptada a diferentes públicos e presença mais coordenada entre ministérios e perfis oficiais.

A disputa pelo protagonismo nas redes

O estudo da Nexus, que monitora interações e menções nas principais plataformas, indica que o governo Lula mantém, desde julho, um patamar alto de engajamento positivo, especialmente entre perfis moderados e influenciadores progressistas.

Enquanto isso, o campo da direita enfrenta dispersão e conflito interno — reflexo das brigas entre aliados de Jair Bolsonaro, que se dividiram em torno de possíveis candidaturas como as de Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Ronaldo Caiado (União Brasil-GO) e Ratinho Júnior (PSD-PR).

“A direita vive um momento de desorganização. As torcidas estão sem comando, sem saber para onde mirar. O governo aproveitou esse vácuo”, explicou Tokarski.

Continua após a publicidade

Ainda assim, o analista pondera que a disputa tende a se equilibrar novamente conforme o calendário eleitoral se aproxima.

“A direita vai se reorganizar. Seja com Tarcísio, Ratinho, Caiado ou até algum familiar do Bolsonaro, eles vão contra-atacar nas redes”, afirmou. “Mas agora o jogo não é mais tão desequilibrado como antes.”

O que explica a virada digital de Lula

Entre os fatores que ajudaram o governo a recuperar terreno, Tokarski destaca: adoção de uma linguagem mais popular e direta, com foco em vídeos curtos e conteúdos emocionais; ampliação da presença do próprio Lula nas redes, com posts diários e respostas a temas em alta; coordenação entre comunicação oficial e aliados políticos, algo que a esquerda não havia conseguido estruturar em mandatos anteriores; uso mais ativo de programas sociais como instrumentos de narrativa digital, com forte apelo visual e emocional.

O resultado, segundo o levantamento, é um ambiente mais equilibrado nas redes — algo impensável há um ano, quando a direita ainda dominava o espaço digital com folga.

Continua após a publicidade

O que vem pela frente

Para Tokarski, o cenário digital de 2025 e 2026 promete ser mais competitivo e imprevisível. A direita ainda detém uma base altamente engajada, mas o governo agora entende o jogo e fala a mesma língua do adversário.

“A esquerda aprendeu com seus erros. A direita vai reagir, mas não deve mais haver o mesmo desequilíbrio. A disputa nas redes será o espelho mais fiel da disputa eleitoral”, concluiu.

Com pouco mais de um ano até o segundo turno das eleições municipais, a guerra digital brasileira entra em nova fase — menos improviso, mais estratégia e, sobretudo, um governo que decidiu jogar o jogo das redes em vez de apenas reagir a ele.

Publicidade

Deixe um Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *