A conta mudou para o produtor rural com holding: o que a reforma tributária traz de novo

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O produtor rural que, ao longo dos últimos anos, organizou seu patrimônio via holding familiar pode precisar rever essa estrutura com urgência. A chegada da reforma tributária mudou a lógica da tributação no campo — e, principalmente, mexeu com a zona de conforto de quem mantinha os imóveis na pessoa jurídica, mas continuava explorando a atividade agrícola como pessoa física.

Com a criação do IBS e da CBS, dois novos tributos que unificam impostos sobre consumo, o fisco passou a olhar com mais atenção para receitas do campo — e, principalmente, para quem ultrapassa o limite de R$ 3,6 milhões por ano. Neste novo cenário, o que antes era visto como um modelo seguro e eficiente pode se tornar um risco tributário (e financeiro) real.

Holding patrimonial com uso pessoal: o modelo que dominou o campoNos últimos anos, cresceu a adesão de famílias do agro a estruturas de holding patrimonial.

A lógica era simples: transferir os imóveis da família para uma pessoa jurídica, que cuidaria da administração do patrimônio rural. Em paralelo, a atividade produtiva — o plantio, colheita e comercialização — seguia nas mãos da pessoa física.Essa separação trazia vantagens evidentes:

• Facilitava o planejamento sucessório e a divisão entre herdeiros.

• Protegia o patrimônio contra riscos operacionais ou litígios.

• Permitia que a pessoa física seguisse usando o regime especial de tributação rural no Imposto de Renda, com livro caixa ou redução presumida.

Na prática, o imóvel rural estava na holding, mas continuava sendo usado pelo produtor como sempre foi.

Com a reforma, a Receita olha diferente para essa estruturaCom a aprovação da reforma tributária 214/2025, o jogo mudou. Entram em cena o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), que vão substituir ICMS, ISS, PIS e Cofins em um único sistema de tributação sobre o consumo. E, diferente do modelo atual, esses tributos serão cobrados também sobre operações ligadas ao campo.

O primeiro ponto de atenção: a obrigatoriedade de recolher IBS e CBS atinge produtores — físicos ou jurídicos, sendo os físico que ultrapassarem R$ 3,6 milhões de receita anual ou aqueles que optarem por contribuir com o IBS e CBS devido as regras de mercado, já o jurídico todos terão IBS e CBS. Isso inclui qualquer produtor que comercialize grãos, frutas, carne ou qualquer outro bem de origem agropecuária.

Ou seja: mesmo que a atividade esteja no CPF, o produtor será considerado contribuinte obrigatório desses novos tributos — com todos os ônus que isso representa.

E mais: a utilização do imóvel rural da holding, mesmo que “pela família”, pode ser interpretada como uma operação tributável caso haja alguma forma de remuneração, seja ela financeira ou produtiva. Se a holding receber parte da safra, por exemplo, essa cessão onerosa poderá ser tributada, ainda que com alíquota reduzida.

Receita alta?

A conta já começa a fechar para migrar à pessoa jurídicaA grande pergunta, agora, é: quando vale a pena migrar tudo para a pessoa jurídica e deixar a exploração na mão da empresa — e não mais do produtor como pessoa física?

A resposta está no faturamento.Acima de R$ 3,6 milhões por ano, a pessoa física entra num terreno mais caro:

• Passa a recolher IBS e CBS.

• Mantém o IRPF sobre o lucro rural, que pode chegar a 27,5% ou o arbitramento.

• Tem menos espaço para planejar, deduzir e se proteger.

Já a pessoa jurídica, além de ter acesso ao crédito de IBS/CBS sobre insumos e serviços, pode contar com uma contabilidade mais precisa, estruturas otimizadas de custos e regimes tributários como o lucro presumido ou lucro real, em que a carga tributária é previsível e, em muitos casos, menor.

Na prática, o que se vê é que a partir desse patamar de receita, a pessoa jurídica começa a apresentar vantagem clara — não apenas pelo alívio tributário, mas também pela segurança jurídica e pela possibilidade de recuperar créditos da cadeia produtiva.

Um alerta necessário

Para o produtor que estruturou sua holding patrimonial e segue explorando como pessoa física, o recado é claro: o modelo ainda pode funcionar — mas não para sempre.

Com a transição para o novo sistema tributário se consolidando até 2033, cada ano será mais difícil manter a estrutura antiga sem encarar consequências financeiras.

A recomendação é junto com contador e advogado tributarista para fazer simulações reais. Calcular, de forma individualizada, quanto custa manter a estrutura atual — e quanto pode ser economizado ao migrar a operação para uma empresa rural, sob controle da família.

A reforma não proíbe a estrutura da holding, mas obriga o produtor a pensar além do patrimônio — e passar a olhar para a operação como um negócio, com números, cenários e estratégias, pois é preciso pensar que as reuniões com o contador não podem ser mais na época do imposto de renda, mas sim mês a mês.

O produtor rural que atinge este patamar de faturamento bruto aqui tratado precisa investir em gestão, não mais se preocupar somente com o que acontece da porteira para dentro, precisa estar assessorado para não perder dinheiro.

No campo, quem antecipa a colheita costuma sair na frente. E com o fisco, não é diferente.

Ruberlei Rocha Machado

Empresário contábil

Contador

Especialista em finanças e tributação

Docente

Colunista

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