Países da União Europeia ainda não chegaram a um consenso sobre compromissos centrais na crise climática, sem sinais de acordo, segundo um rascunho de negociação obtido pelo jornal britânico The Guardian.
Com poucas semanas restantes antes do prazo estipulado pela ONU, a Comissão Europeia e Estados-membros-chave permanecem em impasse sobre as metas de redução de gases de efeito estufa, colocando em risco a perspectiva de resultados fortes na Cop30.
O documento vazado apresenta lacunas marcadas com colchetes e textos provisórios onde deveriam estar os números definitivos das novas metas.
Especialistas consideram a ausência de valores, mesmo provisórios, um sinal preocupante em fase tão avançada das negociações.
Estados-membros e a Comissão Europeia trabalham há meses em um acordo para cumprir os compromissos do bloco no Acordo de Paris de 2015, definindo reduções de carbono para a próxima década. Espera-se que a Cop30 sirva de impulso para negociações de um novo tratado que elimine combustíveis fósseis.
Todos os países devem apresentar planos nacionais de redução de emissões, as chamadas contribuições nacionalmente determinadas (NDCs), mas apenas cerca de 30 até agora cumpriram essa obrigação.
A ONU pediu que todos os países submetam suas NDCs antes de uma reunião paralela à Assembleia Geral em 24 de setembro, para que possam ser avaliadas antes da Cop30 em Belém, no Brasil, em novembro.
A meta atual da UE prevê corte de 55% nas emissões de gases de efeito estufa até 2030 em relação a 1990, objetivo que o bloco poderia atingir se reforçar suas políticas.
A próxima NDC, voltada para 2035, deveria colocar a UE no caminho para alcançar a neutralidade de carbono até 2050, implicando redução de 90% a 95% até 2040 e, portanto, de 74% a 78% até 2035, dependendo do cálculo adotado.
As discussões da UE são ainda mais complexas devido ao calendário interno. O plano europeu para 2040 deveria ser definido primeiro, para que a NDC de 2035 pudesse ser extrapolada.
No entanto, alguns países propõem separar as discussões, definindo primeiro a NDC e depois a meta de 2040, o que provavelmente resultaria em metas mais fracas, segundo especialistas.
O presidente francês, Emmanuel Macron, cogita adiar ou suavizar os compromissos do bloco.
Campanhas ambientais temem que o chanceler alemão, Friedrich Merz, possa ceder, e a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, já se posicionou contra políticas verdes. O líder húngaro Viktor Orbán também pressionaria para reduzir a ambição da UE.
A percepção de falta de compromisso europeu poderia prejudicar a Cop30, já afetada por hostilidade dos EUA e desafios geopolíticos. Donald Trump anunciou novamente a retirada norte-americana do Acordo de Paris e desmonta políticas e instituições ambientais.
Embora nenhum outro país tenha seguido os EUA na saída, Estados interessados em atrasar ou obstruir a Cop30, incluindo petrostados como Rússia e Arábia Saudita, sentiram-se encorajados pela posição de Trump.
China e Índia, que ainda não apresentaram suas NDCs, aproximaram-se da Rússia, reforçando a complexidade geopolítica do encontro.
Brasil terá papel de protagonismo
Como país-sede da COP30, o Brasil terá papel central nas negociações, tanto pela responsabilidade histórica como maior emissor de gases de efeito estufa na América Latina quanto pelo protagonismo ambiental que busca assumir no cenário global.
A conferência, marcada para novembro em Belém, concentra atenções sobre florestas tropicais, políticas de desmatamento e financiamento climático.
O Brasil defende que créditos de carbono gerados por conservação florestal, restauração de ecossistemas e manejo sustentável da terra sejam reconhecidos internacionalmente, criando incentivos econômicos para preservar a Amazônia.
Países europeus e parceiros da ONU exigem critérios rigorosos de verificação e transparência, para evitar fraudes e garantir integridade ambiental.
Financiamento climático será discutido em profundidade. O governo brasileiro busca maior apoio internacional para mitigar impactos do desmatamento, proteger comunidades tradicionais e investir em energia limpa.
Estima-se que cerca de US$ 2 bilhões anuais sejam necessários apenas para conservar áreas críticas da Amazônia.
Outro ponto é a atualização da meta brasileira de redução de emissões.
O país se comprometeu a reduzir 50% das emissões até 2030, mas especialistas afirmam que cortes mais rigorosos são necessários para alinhar-se à meta global de 1,5ºC, incluindo fiscalização do desmatamento ilegal e estímulo à produção de energia renovável.
O governo promete apresentar a NDC atualizada durante a COP30, sem detalhar números finais.
Proteção da biodiversidade e restauração de florestas degradadas também estarão na pauta. Cientistas alertam que a perda acelerada da Amazônia impacta toda a América do Sul e padrões climáticos globais, devido ao papel do bioma na absorção de carbono e manutenção dos ciclos de chuva.
O Brasil ainda precisará negociar mecanismos de adaptação climática para comunidades vulneráveis, incluindo povos indígenas e ribeirinhos, afetados por enchentes, secas e alterações nos regimes de chuva.
A COP30 deverá consolidar discussões sobre cumprimento do Acordo de Paris, pressionando países a apresentarem NDCs ambiciosas e verificáveis.
Para o Brasil, isso representa oportunidade de liderança diplomática, mas também teste de credibilidade em relação à proteção de seus biomas e ao alcance de suas metas de redução de emissões.