Viajei para fazer quatro palestras no Japão, e eis o que encontrei

por Marcos Piangers

“Se você ler apenas os livros que todo mundo está lendo, você só pode pensar o que todo mundo está pensando.” ― Haruki Murakami, Norwegian Wood

Existe a possibilidade de duas pessoas irem para o Japão, fazerem o mesmo roteiro e uma achar deslumbrante, a outra uma tremenda bobagem. Nunca se sabe. Existe o Japão que é sucesso no TikTok – só no ano passado 36 milhões de turistas desembarcaram em Tóquio querendo as mesmas fotos que todo mundo está postando no Instagram. Todos querem comer nos mesmos lugares, conhecer os mesmos lugares, fazer as mesmas poses.

Pra escapar desse Japão poser você tem que se esforçar. Tentar conhecer bairros mais afastados, residenciais, descobrir onde os tiozinhos jantam. Aprender algumas palavras, tentar ser simpático. Pegar o metrô na direção oposta à multidão. Ler livros, ver filmes, ouvir podcasts, assistir documentários e séries. E, mesmo assim, talvez você não conheça o Japão de verdade.

No Japão as ruas não têm nome, você procura um endereço pelo nome do bloco, não da rua. No Japão, não existem lixeiras nas ruas e estações de metrô, todo mundo leva seu lixo pra casa. Quase não há homicídios – mas o primeiro ministro foi assassinado em 2021. Templos budistas estão espalhados por todas as cidades, mas todos estão sempre correndo pro trabalho.

Se você estudou em uma escola e encontra alguém que era de uma turma acima da sua, você deve prestar reverência a ele. Se você brinda com alguém que tem um cargo mais importante que o seu, deve brindar com seu copo mais abaixo do dele. Adoramos celebrar o zen, o wabi-sabi, o ikigai, o komorebi, o boketto japonês. Mas o Japão não parece ligar pra nada disso. É uma sociedade hierarquizada, machista, consumista, obcecada por produtividade. O Japão precisa produzir. O Japão é uma máquina e cada japonês faz parte de uma engrenagem.

“Na maioria das vezes ele encontra o que procura, e isso o destrói.” ― Kenzaburō Ōe, A Personal Matter

Mas se você é fascinado pelo zen, pela perfeição das coisas imperfeitas, pela vida com propósito, pela luz do sol que passa por entre as folhas das árvores, se você se permite olhar ao redor sem realmente pensar sobre algo específico, talvez você consiga ver o Japão. E esse Japão me deixou completamente apaixonado.

Natsukashii

Dizem que a palavra saudade só existe no Brasil, mas é mentira. Em japonês, “saudade” pode ser expressa de várias formas. A nossa saudade, nostálgica, é “懐かしい (natsukashii)”. Uma natsukashii que toma conta de você depois que você visita o Japão.

Sinto falta da beleza de tudo. As letras, os prédios, as cores, as comidas, a elegância da madeira, da decoração, dos jardins. Todos os japoneses se vestem iguais, roupas pretas e brancas e cinzas, todos os prédios e vielas são iguais, os restaurantes pequenos de onde sai vapor de panelas e cumbucas de madeira, os frutos do mar expostos na rua, as miniaturas plásticas de comidas. As torres observatório em todas as cidades. O metrô pontual. A segurança plena na rua, em todos os momentos.

Ir ao Japão é como ir para outro planeta – acho que a melancolia vem daí, você conhecer outro planeta e saber que não viu tudo, e não vai voltar tão cedo. Nosso Japão foi cinza, os dias nublados e a chuva e o frio e as árvores estavam secas – algumas poucas davam spoiler do que seria a primavera, todas aquelas cerejeiras floridas devem ser embasbacantes ao vivo. Esse seria o Japão fácil de amar. Nós amamos um Japão difícil, o vento queimou nosso rosto, a neve causou acidentes, a neblina ocultou o Monte Fuji.

Nosso Japão também foi inesperado: existe lixo no chão, música alta, ratos na rua, propagandas de acompanhantes, michês assediando meninas, senhores velhos vestidos de mulher, há assaltos e assassinatos – um esfaqueamento mortal aconteceu no dia e local que conhecemos algumas horas antes. Isso tudo não me faz amar menos o Japão, me faz olhar com ainda mais deslumbramento para a complexidade de um país historicamente muito, muito, muito louco.

“A jornada em si é meu lar.” ― Matsuo Basho

Viajamos 30 horas. Curitiba Guarulhos Washington Tóquio. Durante a viagem, o aviãozinho virtual na tela do banco da frente, que mostra o trajeto, não se mexia. Fucking 30 horas. Acerto: levei um chinelinho macio e me senti na primeira classe, mesmo estando na 51B da United. Outro acerto: colocar celular e relógio no horário japonês – fui enganando meu cérebro. Desembarcamos completamente cansados, mas dormimos no hotel e no outro dia de manhã estávamos novos.

Guto e Johnattan, nossos contatos no Japão, nos receberam com a família toda. Brasileiros no sushi, pedíamos no tablet e as peças chegavam em uma esteira relâmpago. Ovas. Edamame (descobrimos que a sílaba tônica é a última). Ouriço. Polvo. O quarto do hotel é realmente pequeno, mas a patente esquenta, lava a bunda e joga ventinho. Tem banheira, mas no segundo andar do hotel tem algo melhor: onsen, o banho público japonês.

O último Seppuku

Hiperfoco. Em 2024 li duas biografias do Paulo Leminski, todos os seus livros de poemas, o doidão Catatau e seus quatro livros de perfis, além de seu livro infantil zen. Foi como uma preparação para o Japão. Leminski era chamado de Samurai da poesia. Amava o Japão, o zen, Bashô, Mishima. Fiquei especialmente fascinado pelo Mishima, o escritor que tentou dar um golpe de estado imperialista, e que se matou na sede do governo como faziam os samurais envergonhados: rasgando a própria barriga com uma espada. Isso, em 1970.

Assisti a cinebiografia do Mishima feita pelo Paul Schrader, o fantástico Harakiri do Masaki Kobayashi, revi alguns Ghibli, os filmes perfeitos do Kurosawa (nunca ninguém conseguiu fazer filmes melhores), Xógum: A Gloriosa Saga do Japão na Disney+, a história da unificação japonesa no Youtube, os filmes maravilhosos do Koreeda, o chatíssimo Drive My Car. Mas nenhum filme japonês me pegou tanto quanto Perfect Days, do Win Wender. Uma delícia zen, sobre um homem que resiste à transformação do japonês em máquina limpando banheiros em Tóquio.

No primeiro dia em Tóquio fiz a caminhada Perfect Days: a casa onde Hirayama mora, os banheiros que limpa, o rio Sumida, a ponte onde viu o pôr do sol com a sobrinha. Kondo a kondo ima wa ima. Amanhã é amanhã. Agora é agora. Kondo a kondo ima wa ima. Caminhar por Sumida é ver o Japão calmo, residencial, comezinho. Vi a Tokyo Skytree de todas as formas, tirei 36 fotos diferentes dela, Thirty-six Views of Tokyo Skytree.

Neste dia também vimos o Templo Meiji, o bairro chique Ginza, o mercado de peixe. Fui em uma exposição no museu do Katsushika Hokusai, o cara que pintou A Grande Onda de Kanagawa, parte das 36 visões do Monte Fuji. Comprei um livro no museu e quando pediu senha todos os japoneses se viraram de costas, achei engraçado.

Quer ir?

  • Uma próxima vez.
  • Quando é isso?
  • A próxima vez é a próxima vez.
  • Quando exatamente?
  • A próxima vez é a próxima vez. Agora é agora.”

Perfect Days, Wim Wenders

Sebunirebun e Rawson

Todos os estabelecimentos japoneses têm duas inscrições em suas fachadas: um em japonês Hiragana, literalmente sílabas, e novamente escrito em Kanji, aquele desenho que parece letra chinesa (de onde, inclusive, vem). Então uma cafeteria terá seu nome escrito スターバックス e do lado “珈琲”, o kanji de café.

Imaginei toda uma nova camada de significado para as empresas, já que a Oficina do Zé, por exemplo, pode colocar ao lado o kanji de família e de ferramenta, por exemplo, dando mais uma sensação para o cliente – essa sensação escapa ao ocidental que não entende kanji. No ocidente, tentamos dar essa camada emocional com logotipos, escolha de fontes, mas o kanji pode dar um significado desejado imediato, quase literal.

Japão, por exemplo, se escreve assim: ⽇本. O Kanji de sol e o kanji de livro, ou sabedoria. O Kanji de sol também é o de domingo. O kanji de livro, sem aquele risco horizontal embaixo, vira o kanji de árvore (entende? O risco representa que a árvore foi cortada e virou livro! Genial). E você pode misturar os kanjis: dois kanji de árvore é um bosque, três é floresta.

Além do Hiragana e dos Kanjis, existe o Katakana: o alfabeto japonês para palavras estrangeiras. Então Mcdonalds vira マクドナルド, literalmente Makudonarudo. Starbucks vira スタバ (Sutaba). As lojas de conveniência 7eleven viram Sebunirebun. E a outra loja de conveniência Lawson vira Rawson, porque os japoneses não usam nem pronunciam a letra L (por isso chamam lamen de ramen).

Meu katakana favorito é canudo. Straw vira Sutorô, que soa como estouro.

As palavras mais importantes de saber ao visitar o Japão são:

Sumimasen, algo como com licença, me desculpe, pra iniciar uma conversa.

Kudasai, que é por favor, pra pedir algo.

Arigatô Gozaimasu, obrigado. Ninguém fala apenas arigatô, o gozaimasu é mais importante, às vezes eles falam apenas “maaaaasssss”.

Bom dia é Ohaiô Gazaimas, boa tarde é konnichiwa e boa noite é konbanwa, ótimas formas de dizer oi quando entrar em uma kombini.

Kombini são as lojas de conveniência, que estão literalmente por todo lado. Em uma quadra você pode ver quatro lojinhas, cheias de comida, salgadinho, bebida alcóolica, cafés quentes e gelados. O japonês comum acorda no seu cubículo, toma café da manhã na kombini, pega o metrô pro trabalho, almoça uma comida pronta que comprou na kombini, trabalha até o fim do dia e volta no metrô abarrotado.

Dizem que é uma ofensa encostar em um estranho no Japão mas isso não vale para o metrô lotado: os japas entram no trem de costas, empurrando tudo o que estiver atrás deles. Depois cada um fica no seu celular, o silêncio é absoluto. A voz do sistema de som avisa a próxima parada sempre com um arigatô gozaimasu no final das sentenças. O sistema de metrô te leva pra qualquer lugar por menos de dez reais.

Fuji e o divino

“Todo o Céu e a Terra

Floresceram brancos…

Neve… neve incessante”

― Hashin, Haiku Japonês

No dia 2 pegamos a estrada para ver o Monte Fuji. A maior montanha japonesa é cercada de mitos – um dia quero subir até o topo. O sol estava perfeito, caminhamos pelo parque para ver o monte de perto, depois caminhamos pela pequena cidade de Fujiyoshida, se você colocar no Google Imagens vai entender porque eu queria tanto ir até lá. É lindo, deslumbrante, monstruoso. Foi um dos meus dias favoritos.

Continuamos na estrada até Chiryu, onde eu palestraria no dia seguinte. A cidade é pequena e o hotel tenebroso, mas tomamos um bom café da manhã no dia seguinte, em um pequeno e simpático estabelecimento que servia sanduíches de curry (em katakana, carê). O evento foi lindo: 250 pessoas na primeira sessão, cerca de 200 na segunda sessão, teatro incrível, um público majoritariamente de brasileiros que foram pro Japão atrás de uma vida melhor.

Os brasileiros que chegavam no Japão antigamente pagavam uma passagem cara para uma agência que cobrava três vezes mais. A maioria trabalha em fábricas por quantas horas for possível com o objetivo de fazer a maior quantidade de dinheiro possível. Muitos mandam dinheiro pro Brasil. Muitas famílias trabalham tanto que não tem tempo de se conhecerem direito, as crianças não são cuidadas apropriadamente, existem problemas sérios nessas famílias.

No dia seguinte fomos para Nagoya, onde visitei um templo budista Soto Zen e participei de uma cerimônia muito tocante. O incenso, os pedidos escritos em placas de madeira, os mantras, tudo é envolvente e particularmente emocionante. É um ritual dogmático como qualquer outro, todos homens de vestidos dourados, mas todos esses signos orientais me trazem paz e comunhão com o divino.

“Sonhos, memórias, o sagrado — todos eles são semelhantes no sentido de que estão além do nosso alcance. Uma vez que estamos, mesmo que marginalmente separados do que podemos tocar, o objeto é santificado; ele adquire a beleza do inatingível, a qualidade do milagroso. Tudo, realmente, tem essa qualidade de sacralidade, mas podemos profaná-lo com um toque. Quão estranho é o homem! Seu toque contamina e, ainda assim, ele contém a fonte dos milagres.” ― Yukio Mishima, Spring Snow

Depois de um evento em Nagoya, fomos até Osaka, onde dormimos em um hotel no meio da bagunça de Dotombori.

Osaka, Kyoto e Nara

Takoyaki é um bolinho de polvo, geralmente vendido nas ruas de Osaka.Okonomiyaki é uma panqueca feita com repolho e macarrão, coberta com carne e maionese. Yakitori são espetinhos japoneses, com as mais variadas carnes e legumes. Osaka é conhecida como a cidade da comida de rua no Japão. Terceira maior cidade do país, um dos lugares onde a comida de rua é mais famosa.

Chegamos em Osaka perto da meia noite, nosso hotel ficava em Dotombori. O que falar sobre Dotombori? É um distrito bagunçado, turístico, barulhento, lotado, sujo, cheio de ocidentais mal encarados, cheio de japoneses jovens se oferecendo como acompanhantes – nos disseram que eles levam o cliente para um bar e ganham uma porcentagem em quanto eles conseguem fazer o cliente beber.

No dia seguinte, almocei sozinho no Toyo Izakaya, vendo o mítico chef Toyo queimar a própria mão preparando peixes maravilhosos, uma experiência que recomendo demais. Depois fui em um museu, caminhei pelo distrito otaku até a torre Tsutenkaku. Tudo muito turístico. Jantamos em um restaurante de Wagyu, também bastante turístico. De todas as experiências de Osaka, o Toyo foi disparado a coisa mais autêntica.

“Não importa onde você esteja, você está sempre um pouco sozinho, sempre um estranho.” ― Banana Yoshimoto, Goodbye Tsugumi

Passamos o dia seguinte na Universal Osaka, na área do Super Mario que é visualmente incrível. Virei esse cara que ama ir em parques de diversão com as minhas filhas. No fim do dia, depois de várias montanhas russas, aquele entardecer meio mágico, todo mundo cansado e indo embora do parque. É uma sensação deliciosa que quero ter mais vezes.

Em Quioto, conhecemos os templos principais e tiramos todas aquelas fotos que todo mundo quer tirar – nenhuma ficou boa. Fizemos uma experiência que vale mencionar: a experiência Tainai meguri, no Zuigu-do Hall do Templo Kiyomizudera. Construído em 1735, é uma sala completamente escura em que você caminha segurando uma corda como guia, até chegar em uma linda pedra redonda e iluminada em que as pessoas colocam as mãos e fazem pedidos. A experiência é toda muito bonita, intenciona representar um renascimento.

“Se a luz é escassa, então a luz é escassa; mergulharemos na escuridão e lá descobriremos sua beleza particular.” ― Jun’ichirō Tanizaki, Em Louvor às Sombras

Depois disso as meninas foram ver um teatro de gueixas e eu uma exposição do incrível Robert Doisneau no Museu de Artes de Quioto. No sofá do museu, dois senhores japoneses dormiam, fingindo ler o jornal. Jantamos em um izakaya que não era turístico, mas certamente nos roubou na conta (20.000 ienes, cerca de 800 reais).

No dia seguinte, bem cedo, aluguei uma bicicleta e vi a cidade amanhecer. Visitei um parque lindo e vi uma cerimônia em um templo incrível. Fomos para Nara, uma cidade fofa com um parque famoso pelos cervos que andam livres e fazem reverência para todo visitante, esperando comida em troca. Fizemos aula de escrita japonesa, as meninas se vestiram de gueixas, conhecemos um dos maiores Budas de madeira do mundo, 15 metros de altura, novamente o divino nos abraçou. Lola fez um pedido em uma placa de madeira que ficou balançando ao vento. Alimentamos os cervos e voltamos para Quioto.

De lá, as meninas seguiram de trem bala para Tóquio e eu fiz mais um evento em Hamamatsu. Na estrada, neve. Quando chegamos no hotel de Tóquio as meninas estavam maravilhadas com a neve, fizeram o banho público no hotel na parte externa, com água quente na piscina e neve caindo do céu. Disseram que foi uma experiência surreal.

“A verdadeira alegria de uma noite de luar é algo que não mais entendemos. Somente os homens de antigamente, quando não havia luzes, conseguiam entender a verdadeira alegria de uma noite de luar.” ― Yasunari Kawabata, Histórias da Palma da Mão

Tóquio, TeamLabs e o adeus

Em Tóquio andamos de metrô, caminhamos por bairros menos turísticos, tomamos Yakult (pouco! deveria ter tomado mais! Melhor bebida). As meninas se afundavam em lojas enquanto eu conhecia parques. Jantamos no restaurante que inspirou a cena da Noiva contra os Crazy 88, em Kill Bill. Tomei um saquê de Chiryu, certamente o melhor saquê que já tomei, e sinto saudades dele. Natsukashii.

Vimos o hotel de Encontros e Desencontros. Atravessamos Shibuya Crossing dez vezes. Tiramos fotos com o cachorro que sempre voltava atrás do dono morto. Vimos o 3d Cat e a cabeça do Godzilla. Jantamos em um sushi com estrela Michelin. Comemos mochi e vimos as sakura florescendo. No penúltimo dia fomos ao TeamLabs, imperdível.

“Tudo o que aconteceu foi chocantemente lindo, o suficiente para deixar você louco.” ― Banana Yoshimoto, NP

É um museu de experiência com filiais em Macao, Beijing, Gidá e Abu Dhabi, uma experiência psicodélica de interação com tecnologia. A música é hipnotizante, você anda descalço na água, interage com projeções de animais extintos, escala montanhas imaginárias, faz desenhos que depois ganham movimento nas paredes do museu. Minha sensação foi de um mundo sem Deus, em que tudo que achamos deslumbrante foi na verdade criado por humanos.

Sinto experiências ditas divinas quando estou imerso na natureza. Nesse sentido o TeamLabs foi uma experiência profana, mundana, laica. Como se aquilo tudo dissesse que o divino não existe, existe apenas a engenhosidade humana e até mesmo as religiões são tecnologias inventadas para nos sentirmos menos solitários. A imagem que me veio foi de um ser humano chegando até o fim da experiência humana para, depois dela, não encontrar nada, apenas um grande robô criado por ele mesmo. Foi uma experiência profunda e emocionante, difícil de explicar. Mas é claro, tem a chance de você passar por lá e achar tudo uma grande bobagem. Nunca se sabe.

Nos despedimos de nossos novos amigos em uma quarta-feira chuvosa. O embarque no aeroporto de Haneda foi silencioso e organizado, uma senhorinha com uma plaquinha mostrava o grupo que estava embarcando, sem ficar gritando no microfone. Foi um embarque zen, em uma quarta-feira chuvosa e nublada. A neblina cobria toda a pista. Mesmo assim, máquinas gigantescas pousavam e decolavam.

Na abertura da biografia que escreveu sobre Bashô, Paulo Leminski escreveu que “‘Tabi’ (viagem) é uma das palavras prediletas de Bashô (a outra é “yumê”, sonho)”. O Japão é tabi, é yumê; viagem e sonho se misturam, tecnologia e divindade, correria e zen. Certamente o lugar mais apaixonante que visitei. Neste momento, as cerejeiras florescem. Penso em como está a cidade, a calçada, as duas garrafinhas de Yakult abandonadas no metrô. Os 36 milhões de turistas. Estão entendendo o Japão? Ou apenas se amontoando nos templos, tirando suas fotos ruins?

“Sentado em silêncio, sem fazer nada, a primavera chegae a grama cresce sozinha.”
― Matsuo Basho

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