Fiesp projeta crescimento de 2,2% para o PIB em 2024, embora identifique fatores de risco para a concretização desse cenário
O PIB brasileiro cresceu 0,8% no 1º trimestre de 2024 em relação ao 4º trimestre de 2023, após registrar resultados próximos à estabilidade por dois trimestres consecutivos, considerando dados com ajuste sazonal. Este desempenho veio em linha com a projeção da FIESP (+0,8%) e próximo da expectativa do mercado (+0,7%). Com este resultado no 1º trimestre do ano, o carregamento estatístico [1] para 2024 é de 1,0%.
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Pela ótica da oferta, a principal variação positiva foi registrada pela agropecuária, que exibiu aumento de 11,3% sobre o 4º trimestre de 2023. O setor de serviços também apresentou crescimento, de 1,4%, com destaque para os segmentos de comércio (+3,0%) e informação e comunicação (+2,1%).
A indústria geral, por sua vez, registrou redução de 0,1% no trimestre, com queda em todos os segmentos, com exceção da indústria de transformação. A indústria extrativa mineral e o setor de eletricidade, gás, água e esgoto caíram 0,4% e 1,6%, respectivamente. A construção civil também registrou queda, de 0,5%. Já a indústria de transformação, que representa cerca de 60% da indústria geral, cresceu 0,7% no período.
No que se refere à ótica da demanda, as exportações cresceram 0,2% no trimestre, enquanto as importações aumentaram 6,5% no mesmo período. Além disso, o consumo das famílias cresceu 1,5%, enquanto o consumo do governo ficou estável na passagem trimestral. Por fim, a formação bruta de capital fixo cresceu 4,1% no 1º trimestre de 2024. Todos os dados acima contemplam ajuste sazonal e são detalhados na Tabela 1.
Tabela 1 – Variações trimestrais do PIB (em %)
Fonte: elaboração FIESP a partir de dados do IBGE.
Principais vetores do crescimento no 1º trimestre
O crescimento da economia brasileira nos três primeiros meses do ano foi influenciado, dentre outros fatores, pelo setor agropecuário. Além disso, o 1º trimestre do ano foi marcado, principalmente, pela resiliência do consumo e de serviços, devido à expansão da renda, que foi turbinada pelo pagamento dos precatórios.
Em dezembro de 2023, o governo federal antecipou o pagamento de precatórios no montante de R$ 93,1 bilhões (cerca de 0,8% do PIB) [2]. Além disso, no início de 2024, o governo antecipou o pagamento previsto para o ano de cerca de R$ 30,0 bilhões para o primeiro trimestre. Este pagamento foi concentrado, principalmente, no mês de fevereiro.
O Gráfico 1 apresenta os valores despendidos pela União em precatórios e demais sentenças judiciais. Como é possível observar, no acumulado entre dezembro de 2023 e fevereiro de 2024, estes pagamentos resultaram na injeção de R$ 131 bilhões, cerca de 1,1% o PIB, na economia, o que correspondeu a um importante impulso fiscal no início do ano.
Gráfico 1 – Precatórios e demais sentenças judiciais pagas pela União (R$ bilhões, preços constantes) – Acumulado entre dezembro e fevereiro
Fonte: elaboração FIESP a partir de dados da Secretaria do Tesouro Nacional (STN).
Outro elemento fundamental que contribuiu para o dinamismo da economia brasileira nos três primeiros meses do ano foi a continuidade do mercado de trabalho aquecido. Em março, o Brasil registrou taxa de desemprego de 7,9%, patamar mais baixo para essa época do ano desde 2014 (quando ficou em 7,2%).
Com ajuste sazonal, a taxa de desemprego foi de 7,5%. Além disso, o mercado de trabalho brasileiro seguiu apresentando crescimento da população ocupada. De acordo com dados do CAGED, houve a criação de aproximadamente 730,8 mil novas vagas de emprego formal entre janeiro e março de 2024, consideravelmente acima das 520,3 mil vagas criadas neste mesmo período no ano passado.
Ademais, o país seguiu apresentando forte crescimento da renda do trabalho no início do ano. Em comparação com o 1º trimestre de 2023, o rendimento do trabalho exibiu crescimento real de 4,4%, enquanto a massa salarial subiu 7,7% acima da inflação no mesmo período. Somado a estes fatores, destaca-se o aumento real do salário-mínimo e seu impacto sobre os benefícios sociais e, sobretudo, previdenciários.
Como consequência, a massa salarial ampliada cresceu cerca de 10,4% em termos reais no 1º trimestre de 2024 na comparação com o mesmo período do ano anterior (Gráfico 2). Como é possível observar, esse forte crescimento da massa salarial ampliada foi puxado pela expansão de todas as fontes de renda que compõem o indicador (Gráfico 3) e contribuiu para o bom desempenho do consumo no início do ano.
Gráficos 2 e 3 – Crescimento trimestral da Massa Salarial Ampliada (variação real – em %) e Decomposição do crescimento trimestral da Massa Salarial Ampliada (variação real – em p.p.)
Fonte: elaboração FIESP a partir de dados do IBGE, Ministério do Desenvolvimento Social e Receita Federal.
*Obs.: o grupo “Outros” inclui as diferentes modalidades de saques do FGTS, os fundos de pensão fechados, dentre outros. Cabe destacar que, no ano de 2024, também é incluído nesta rubrica o pagamento dos precatórios.
Cabe destacar, também, o bom desempenho dos indicadores de crédito no início do ano. O aumento das concessões de crédito, sobretudo dos recursos livres, e a diminuição do endividamento das famílias – embora em ritmo lento – favoreceram o consumo no início do ano.
Investimentos (FBCF) apresentam ritmo mais forte de crescimento no 1º trimestre
Além do consumo, um dos destaques positivos do 1º trimestre foi o bom desempenho dos investimentos, que aumentaram 4,1% no período, crescimento mais forte do que o registrado no 4º trimestre do ano passado (+0,5%). Este resultado foi influenciado pela retomada da produção de bens de capital, que tem sido favorecida pela melhora das expectativas dos empresários, com influência das medidas anunciadas pelo governo federal, como Depreciação Superacelerada, Mover e o Plano Mais Produção (P+P). O gráfico abaixo apresenta o comportamento historicamente correlacionado entre a confiança da indústria, divulgada pela Sondagem Industrial da FGV, e a formação bruta de capital fixo.
Gráfico 4 – Confiança da Indústria versus Investimentos no Brasil – crescimento acumulado em 12 meses do investimento defasado em 6 meses
Fonte: elaboração FIESP a partir de dados do IBGE e da FGV.
Indústria de transformação volta a crescer, mas possibilidade de taxa Selic terminal mais alta é fator de risco para a continuidade do bom desempenho do setor
Além da retomada de bens de capital, destaque também para a categoria de bens de consumo duráveis, que tem sido impulsionada pelos efeitos da flexibilização da política monetária e pela continuidade da expansão da renda. Como consequência deste cenário, a indústria de transformação voltou a crescer no 1º trimestre de 2024, após registrar estabilidade no 3º e no 4º trimestre de 2023.
Contudo, o quadro esperado pelo mercado de menor intensidade do corte dos juros pode dificultar a trajetória de retomada consistente da indústria. O COPOM reduziu a Selic para 10,50% em sua última reunião (08/05). O ajuste de 0,25 ponto percentual significou uma desaceleração do ritmo de cortes de juros. Segundo a autoridade monetária, o balanço de risco está mais desafiador: projeções piores para inflação, um cenário externo mais adverso, com postergação na redução dos juros nas economias desenvolvidas, e um mercado de trabalho doméstico resiliente.
No comunicado da decisão, a autoridade reconheceu que a SELIC permanecerá restritiva até que se garanta a convergência da inflação e das expectativas para ao redor da meta. Importante ressaltar que a política monetária em ambiente restritivo significa uma taxa Selic acima do juro neutro, estimado entre 7,5% e 8,0%, segundo o Banco Central [3].
Diante desse quadro, a expectativa do mercado no momento é de um juro terminal de 9,18% no atual ciclo de flexibilização monetária [4]. No início do ano, a expectativa era de um juro terminal de 8,50%. Esse cenário para a política monetária coloca em risco a trajetória de recuperação esperada para a indústria de transformação, um setor notadamente mais sensível aos ciclos de juros.
No entanto, o impacto negativo dos juros em níveis restritivos não ocorre de forma uniforme entre os setores da indústria. Há idiossincrasias na indústria de transformação que levam os setores a reagirem de maneiras distintas às altas/reduções dos juros. Exemplificando, nos ciclos de juros, os setores produtores de alimentos e de derivados e biocombustíveis, menos sensíveis à política monetária, apresentam uma dinâmica distinta da exibida pelos setores produtores de veículos automotores e de máquinas e equipamentos, mais sensíveis aos juros.
Juros estacionados em níveis restritivos podem dificultar a trajetória da recuperação dos setores mais sensíveis aos juros, os quais foram os mais afetados pelo último ciclo de aperto monetário. O gráfico abaixo mostra a trajetória da produção da indústria de transformação decomposta entre setores mais ou menos sensíveis à política monetária [5] comparando com a evolução da taxa Selic ao longo do tempo.
Gráfico 5 – Setores da Indústria de Transformação mais e menos sensíveis à política monetária – Dados dessazonalizados – Base: 2022=100
Fonte: elaboração FIESP a partir de dados do IBGE e da FGV.
Projeções da Fiesp para o PIB em 2024
Diante deste cenário e das informações disponíveis até o momento, a Fiesp projeta crescimento de 2,2% para a economia brasileira em 2024. Existem, no entanto, fatores de risco para a concretização desse cenário. Além da expectativa de uma taxa Selic terminal mais alta do que o inicialmente esperado no começo do ciclo de flexibilização, destaca-se o potencial impacto negativo do desastre climático ocorrido no Rio Grande do Sul sobre o crescimento neste ano. Com base em projeções preliminares, a Fiesp estima perda potencial de, pelo menos, 0,34 p.p. no crescimento do PIB brasileiro em 2024 em decorrência das fortes chuvas no estado.
Para o PIB da indústria de transformação, a Fiesp espera crescimento de 1,5% em 2024. Já para o PIB do estado de São Paulo, a Fiesp projeta crescimento de 2,4% no ano.