Advogados de defesa dos seis denunciados por trama golpista que integram o chamado núcleo 2 apresentaram nesta terça-feira (22) suas argumentações à Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). A corte decidirá se acolhe ou não as denúncias apresentadas pela Procuradoria Geral da República (PGR).
Entre as acusações, estão a elaboração de minuta de decreto para justificar juridicamente o golpe de Estado no final do governo de Jair Bolsonaro; o monitoramento do ministro do STF Alexandre de Moraes e ações da Polícia Rodoviária Federal (PRF) para dificultar a circulação de eleitores do Nordeste durante o pleito de 2022.
O núcleo 2 é composto pelo delegado da Polícia Federal Fernando de Sousa Oliveira; o ex-assessor para Assuntos Internacionais da Presidência da República Filipe Garcia Martins Pereira; o coronel da reserva do Exército e ex-assessor da Presidência da República Marcelo Costa Câmara; a delegada da Polícia Federal Marília Ferreira de Alencar; o general da reserva do Exército e ex-secretário Executivo da PR Mário Fernandes, e o ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal Silvinei Vasques.
Fernando Souza Oliveira
Na sustentação oral em defesa de Fernando Souza Oliveira, o advogado Danilo Davi Ribeiro disse que seu cliente não havia, a princípio, sido denunciado pelo envolvimento com os atos de 8 de janeiro, mas, sim, por crime de violência política nas eleições.
“Nossa defesa, nesses dois anos, foram feitas nesse sentido. Fomos portanto surpreendidos com a denúncia envolvendo os fatos de 8 de janeiro, de que ele teria agido como omissão”, argumentou o advogado.
Segundo Ribeiro, a análise do celular de Oliveira não teria identificado qualquer questionamento sobre a regularidade das urnas eletrônicas ou contra o sistema eleitoral, contra o STF ou seus ministros. “Tampouco qualquer menção sobre golpe de Estado, intervenção militar ou afins”, acrescentou.
Sobre os contatos telefônicos que teriam sido feitos com o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o advogado disse que foi, na verdade, apenas um contato por conta do convite feito a ele para se juntar à equipe da Secretaria de Segurança Pública.
“Esse aceite o colocou no olho do furacão. Ele assumiu no dia 4 de janeiro. Ainda estava conhecendo o trabalho quando, ao final do dia, Anderson Torres avisou que ia sair de férias e que Fernando teria de ficar à frente da secretaria”, justificou o advogado ao negar qualquer omissão de seu cliente durante os atos do 8 de janeiro.
“Inclusive foi ele quem acionou a Força Nacional. [No entanto, o] comando da PMDF, em 7 de janeiro, por meio do Flávio Alencar [major da PM], disse que não permitiria a atuação da Força Nacional na Esplanada”, disse ao enumerar uma série de manifestações da PMDF, apensadas aos autos, nas quais afirmava ter tomado todas as providências necessárias.
Felipe Martins
Advogando para Filipe Garcia Martins Pereira, Marcelo Almeida Santana criticou a forma como alguns dados de seu cliente foram acessados, bem como as dificuldades de acesso a esses dados.
“Pedimos esclarecimentos sobre as reuniões que tiveram a participação do Felipe. Essas provas precisam ser compartilhadas”, cobrou.
O advogado apresentou à Corte duas opções: “Ou se rejeita a denúncia, invertendo essa carga probatória em razão da ausência do Ministério Público ter se desenvolvido do seu ônus processual; ou nós vamos admitir que esse processo não está para julgamento e vamos corrigir isso”.
Referindo-se a alguns depoimentos acusatórios utilizados pela PGR na acusação, Santana disse que o termo usado contra seu cliente foi de que ele “possivelmente” teria feito a leitura de alguns considerandos que seriam os fundamentos jurídicos para a minuta do decreto que vibilizaria o golpe de Estado.
“Ele então possivelmente leu o conteúdo e depois se retirou do local, ficando lá apenas ministros militares e Bolsonaro”, acrescentou, ao minimizar a participação de Felipe Martins nessa e em outras reuniões citadas no processo.
Marcelo Costa Câmara
Representante de Marcelo Costa Câmara, o advogado Luiz Eduardo de Almeida Santos Kuntz disse que a individualização do processo não foi feita para seu cliente. Nas argumentações apresentadas, ele disse que a corte não teria competência para fazer o julgamento.
“Além disso, não tivemos acesso aos documentos originais”, reclamou, ao criticar o fato de a equipe de defesa ter acessado apenas as cópias dos documentos, procedimento que comprometeria o julgamento.
“Temos de discutir a validade das provas no início do processo, e não no final”, defendeu.
De acordo com o advogado, nenhuma conversa obtida a partir de celulares e de um computador apreendido faz referência à participação de Câmara na operação Punhal Verde-Amarelo que, segundo a denúncia, teria como objetivo assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu vice Geraldo Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
O advogado argumentou que, a exemplo do que aconteceu no caso das vacinas, nenhum dos denunciados têm prerrogativa de foro, motivo pelo qual o processo deveria ser declinado imediatamente.
Marília Ferreira de Alencar
O advogado Eugênio Aragão, atuando em defesa da delegada federal Marília Ferreira de Alencar, negou que sua cliente tenha atuado para ajudar a PRF a montar as barreiras para dificultar que eleitores de Lula participassem do pleito eleitoral no segundo turno das eleições presidenciais.
Ele negou também que ela tenha sido omissa no dia 8 de janeiro.
“Não há, nessa denúncia, nenhuma especificidade de qual foi sua conduta. Apenas diz-se que ela teria elaborado um boletim de informação, que teria sido usado por Silvinei [então diretor-geral da PRF]”, disse.
“Ocorre que no próprio relatório policial, quando sobrepõe os lugares onde Silvinei Vasques montou as suas barreiras e os pontos que foram apontados como de risco [no boletim], não há coincidências. O boletim não visava impedir [o deslocamento dos eleitores]. Visava a identificar áreas de possível confronto entre bolsonaristas e partidários do presidente Lula”, acrescentou.
Aragão explicou que essa era exatamente a função da delegada na secretaria em que trabalhava, no Ministério da Justiça e Segurança Pública, como diretora de Inteligência.
“Na atividade de inteligência busca-se saber quais são as probabilidades de haver um risco à ordem pública. Foi exatamente o que ela fez”, complementou.
Ele lembrou que a delegada tinha acabado de assumir o cargo no ministério, e tomou “todas as providências que estavam ao seu alcance, determinando a feitura dos relatórios de inteligência”, e que fosse distribuído aos escalões inferiores.
“O que ela pensa ou acredita, não me diz respeito. Quero saber dos fatos. Por isso me convenci de sua inocência e peço portanto que a denúncia seja rejeitada”, argumentou.
Mário Fernandes
O advogado Marcos Vinicius de Camargo Figueiredo fez a defesa do general da reserva do Exército e ex-secretário Executivo da PR Mário Fernandes. Segundo ele, seu cliente estaria condenado previamente ao julgamento.
“É impossível que a sentença esteja pronta antes do devido processo legal”, denunciou.
Segundo ele, “prisões cautelares não podem e não devem ser utilizadas pelo poder público como instrumento de punição antecipada, tal como está sendo aplicada”.
O advogado disse que apresentará “um laudo pericial que vai demonstrar que nós ainda não temos a cadeia de custódia”.
“Não se convençam antes da hora. É tudo o que se suplica a essa honrosa tribuna”, disse.
Silvinei Vasques
Defensor do ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal Silvinei Vasques, o advogado Anderson Rodrigues de Almeida criticou a forma como as delações premiadas têm sido conduzidas pela Corte.
Segundo ele, a delação feita contra Vasques [por Mauro Cid, ex-ajudante de Ordens de Jair Bolsonaro] foi “completamente genérica”, deixando de “especificar de forma pormenorizada quais atribuições constitucionais teriam sucedido em desconformidade”.
“A colaboração premiada firmada por Mauro Cid não possui credibilidade alguma”, disse.
Segundo o advogado, os locais de fiscalização dos pontos fixos da PRF não foram previstos em relatório.
“Além disso, nunca chegou qualquer tipo de reclamação de qualquer cidadão que tenha tido o seu direito constitucional de voto suprimido por conta de alguma ação ilegítima ou arbitrária da PRF sob seu comando”, acrescentou ao lembrar que a abstenção no segundo turno das eleições foi a menor desde 2006.