Se ela ainda acredita na fada do dente, não sei. Acabou de cair seu nono dente. Quer dizer, não caiu; foi tirado. Como tudo com a Aurora, sem drama, sem choro, sem vai não vai. “Ó, pai, tá mole” de manhã; “vou arrancar” de tarde; PLEC, “tirei!”, de noite. Sai pela casa pulando, liga para as avós pra mostrar a banguela, coloca o dentinho embaixo do travesseiro e dorme sussurrando musicalmente “oba, dinheeeeiroo, oba, dinheeeeiroo”. No outro dia, cinco reais aparecem. Ela comemora o dia todo, compra balas e come todas, uma de cada vez, ficando literalmente vesga a cada sabor novo que sente. “Huuuummmm, morango! Adoro morango”. E adora uva, abacaxi, framboesa. Aurora adora tudo. Aurora adora a vida.
Cada criança vem ao mundo para nos ensinar algo e, se minha filha mais velha me ensinou na marra a ser pai, minha filha mais nova me ensinou a sorrir.
Ela me transformou em alguém leve porque todas as vezes que fui pesado ou sério, ela me repreendeu. “Pai, não seja assim”, ela me disse muito nova. “Eu fico triste quando você fica bravo”, me falou faz muitos anos. Então, do lado dela, tento ser sorridente e brincalhão, transformar toda tarefa em jogo, toda situação em roteiro de desenho animado. E no último ano, que passamos juntos todos os dias, confesso: acho que foram os melhores meses da minha vida.
Sei que lá fora o mundo está em uma situação preocupante. Contudo, aqui dentro, acordamos todos os dias com o sol. Aurora vem cambaleando de sua cama até a nossa e nos abraça forte. Minha esposa levanta, eu e Aurora ficamos conversando. Preparamos o café e comemos felizes. Inventamos sempre alguma piada. Trocamos sempre a letra de alguma música. Planejamos todos os dias alguma atividade diferente. Já tivemos sorvete antes do almoço, gravamos podcasts que nunca serão lançados, jantamos à luz de velas, preparamos o almoço da família, fizemos uma festa de forró, compomos música em homenagem à minha mãe.
Se estou em um dia ruim, ela diz: “pai, tenta ficar mais calmo. Respira fundo”. Se ela está em um dia ruim, digo o mesmo. Ouço de tantos pais que gostariam de passar mais tempo com os filhos. Eu já senti isso tantas vezes. Cada dia que passo com a Aurora preencho um pouco daquele vazio, corro em busca do tempo perdido.
Enquanto ela cresce e vira menina, eu diminuo, viro criança.
Essa semana ela está de aniversário. Ano que vem, acreditará na fada do dente?
Feliz aniversário, Aurora.
A vida é incrível!
Desejo a você muito mais do que sorte.
Marcos Piangers